quinta-feira, 17 de junho de 2010

A POLÊMICA DO SÃO JOÃO XANGÔ MENINO EM JEQUIÉ/BA

A POLÊMICA DO SÃO JOÃO XANGÔ MENINO EM JEQUIÉ/BA

Marise de Santana¹

Ao ler Sodré (2005) “A Verdade Seduzida por um Conceito de Cultura no Brasil”, meu entendimento é que o sentido das palavras mudam de acordo com a ideologia de um povo, de uma sociedade.
Na sociedade Brasileira formada por elementos brancos, índios e negros, a cultura aponta confrontos essencialmente contrários marcados de um lado pelo sentido de cultura atribuído pelo colonizador ocidental cristão e, por outro lado, negros e índios com ordem social, trocas e reposição cultural diferenciada. Por exemplo, o nome Xangô que em língua africana Iorubá é Sàngó. Pelo colonizador cristão é entendido como demônio e sua história de vida não está situada como herói civilizatório africano e como elemento da natureza, todavia estudiosos da cultura africana como Beniste (2006) informa que Sàngó é natural da cidade de Tàpà, região fronteiriça ao rio Níger, rei do reino de Oyó, grande justiceiro para o povo africano, representa a justiça, mas também enfrentou os invasores de seu reino cuspindo fogo, daí ele ser ligado aos elementos da natureza, fogo, raios e trovões.
O sentido dado pelos colonizadores à história africana é mítica, como o mito para eles faz parte do que é inferior, menor, é considerada mentira, como se a história do grande Jesus Cristo também não fosse um mito. É importante saber que mito é entendido como história oral, modelo exemplar, como é o mito do Sàngó e de Jesus Cristo.
Quando falo em colonizador, não falo apenas daqueles que implantaram o projeto expansionista de colonização das Américas, mas aqueles que na atualidade são os/as professores/as, comunicadores da mídia, líderes religiosos e outros que ignoram a história, Sociologia e Antropologia das populações Africanas, portanto se portam como o colonizador Pedro Álvares Cabral. Subvertem o sentido das palavras africanas para atender as suas ideologias. Ideologias pautadas numa ordem social racista e nas trocas capitalistas. Ideologia cristã que nunca entendeu que o sincretismo enquanto plano de reposição cultural brasileira faz parte do processo de resistência articulado pelos
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¹Doutora em Antropologia pela PUC/SP, professora titular do Departamento de Ciências Humanas e Letras-DCHL/UESB, Campus de Jequié. Coordenadora do curso de Pós Graduação em Antropologia com Ênfase em Culturas Afro-brasileiras do ODEERE- Órgão de Educação e Relações Étnicas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Docente do mestrado em Desenho, Cultura e Interatividade da UEFS- Universidade Estadual de Feira de Santana. Coordenadora do grupo de pesquisa “Educação e Relações Étnicas: Saberes e Práticas de Culturas Africanas e Indígenas” certificado pelo CNPq/Brasil.

africanos que foram trazidos escravizados quando chegam ao solo brasileiro. Esta articulação africana foi uma das formas de não perder seus referenciais de identidade. Essas Culturas contrárias no Brasil, contrárias no sentido dado pelo educador Pedro Demo afirma que os contrários convivem na dialética da beleza da vida onde mal e bem não se excluem, mas convivem. A cruz como encruzilhada não apenas inclui caminho largo e estreito, mas, os outros tantos. É por isso que nesta beleza o sincretismo se coloca por todo o nordeste, em que se comemora em junho a festa de São João (Santo Católico) e as fogueiras de Xangô (rei de Oyó/ África). É por este motivo que os sábios Gilberto Gil, Maria Bethânia grandes cantores da música clássica brasileira cantam “Viva São João!” e “Viva Xangô menino!”.
O cantor Gilberto Gil no dia 26 de junho em Jequié certamente cantará para São João Batista- Xangô menino; mas também cantará “Viva o milho verde das matas de Oxossi!”. A diversidade cultural de Jequié fala de São João e de Xangô, de São Jorge e de Oxossi. Bom São João Xangô menino!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BENISTE, José. Mitos Iorubás: O Outro Lado do Conhecimento. Rio de Janeiro. Bertrand Brasil, 2006.

DEMO, Pedro. Avaliação Qualitativa. São Paulo. Editora Cortez/Autores Associados, 1987.

SANTANA, Marise de. O legado Africano e o Trabalho Docente: Desafricanizando para Cristianizar. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2004.

SODRÉ, Muniz. A verdade Seduzida por um Conceito de Cultura no Brasil. Rio de Janeiro: 2005. 3ª Edição.